De acordo com dados da FAO, o organismo de agricultura e alimentação da ONU, a Suíça produziu em 2014 cerca de 93 mil toneladas de vinho – seja lá como pesam, esse é o dado oficial. Só para termos uma ideia em termos comparativos: Itália, Espanha e França, todas no mesmo continente, mas com territórios bem maiores, produziam, cada uma, mais de 40 vezes esse volume. Para além desse aspecto, a Suíça importa dez vezes mais do que importa, e sua venda internacional equivale a apenas 2% do volume produzido. Isso representa algo muito simples: o suíço bebe o vinho dos outros, não exporta o seu e toma 98% do que produz. O que quero dizer com tudo isso: comprar vinho desse país fora de lá deve ser difícil.

Assim, até hoje, tomei dois vinhos suíços. O primeiro no Priorato, Espanha, na casa de um amigo que tem família na Suíça e viaja com expressiva frequência para aquele país. Vinho intenso, com mais de 15% de teor alcoólico, casta desconhecida – Gamaret de Vétroz – e rótulo que guardei com carinho (Cave la tine). Depois dessa experiência, vivida em 2014, cheguei a bater na trave em 2016, quando descobri que amigos queridos de Belém do Pará têm família que produz vinho na Suíça. Um deles, inclusive, chegou a viver por lá e trabalhou na vinícola. Teria sido genial, mas não fiz a viagem.

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O destino só colocou um vinho suíço em meu caminho novamente esse ano. Um amigo querido levou os sobrinhos para um tour pela Europa, com passagem por lá. Que baita tio! E no final da viagem comprou duas garrafas que trouxe para o Brasil, quando o provoquei sobre a possibilidade de promovermos o encontro que relato aqui. Da parte dele bebemos um Julius feito a base de merlot, pinot noir, syrah e a incomum cornalin. Depois de uma hora aberto estava muito interessante, com uma delicadeza especial que casou bem demais com nossos frios e queijos, numa noite agradabilíssima.

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Mas a experiência não termina por aqui. Para acompanhar o suíço, “andamos” cerca de 400 quilômetros, deixamos a vinícola que está quase na fronteira com Liechtenstein e fomos ao Jura. Uma região francesa  encravada mais ou menos entre a borgonha e a Suíça com produção pequena, pouco conhecida e com história ligada ao vinho que remete ao ano 80 – não confundir com “os anos 80”. Por lá a apelação Arbois responde por 40% da produção e os tintos somam 22% do volume produzido. E é dessa combinação que vem nosso Domaine de la Tournelle. O site da casa mostra um lugar mágico, com pequeno restaurante, bar em Londres, filosofia atrelada ao bem viver e comer, e compromisso com um vinho biodinâmico. A Ka trouxe a garrafa dos Estados Unidos, e o vinho se mostrou muito interessante. Turvo, feito a partir da Trousseau, uma uva pouco comum para nós, bem frutado, delicado e igualmente capaz de harmonizar com os queijos e frios que comíamos. Uma noite muito especial, com algo raro. Tão incomum quanto finalizarmos com uma sopa finlandesa à base de salmão e dill, incrementada com camarão e servida sob uma massa folhada. Foi assim que encerramos a noite, acompanhados por um alvarinho, afinal de contas os franceses dizem que fechar com vinho branco limpa a alma…

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Fotos retiradas dos sites das próprias vinícolas