Meus amigos e familiares afirmam que trabalho demais. O ritmo é intenso e vivo procurando mais e mais coisas pra fazer. É de minha natureza, e tenho certeza que isso contribui de alguma forma com as causas que abraço, com as amizades que faço e com os resultados que todos nós, juntos, colhemos. Se os últimos anos são intensos, as férias também precisam ser. Mas nesse caso em ritmo oposto: precisam ser MUITO tranquilas. Por isso costumo me apegar infinitamente mais a cidades calmas que a grandes centros. E uma das coisas mais relaxantes que existe é ficar hospedado em uma vinícola, que de preferência seja também um bom restaurante. Nos últimos anos eu e a Ka dormimos em cinco dessas casas. Foram experiências bem diferentes, no Brasil, Portugal, França, Itália e Uruguai.

No Carnaval de 2007 fomos ao Rio Grande do Sul e nos hospedamos na Fornasier, em Bento Gonçalves, região de vinho. Era um lugar bem isolado, em uma estrada sinuosa e tranquila. Criamos uma expectativa imensa, mas à época a casa era grande, o quarto sem charme, as fotos da vista para a cachoeira pareciam muito mais próximas do que de fato a queda de água estava, o vinho era bem simples, a comida bem tradicional e tudo nos frustrou um pouco. Paciência. A região é muito bacana e nos divertimos bastante. Valeu ficar por ali tendo a pousada como um ponto de conexão com lugares mais sofisticados. Ao menos a paisagem descansa.

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Na Páscoa de 2009 foi a vez da Quinta de Santo António, em Tabuaço, região do Alto Douro, tombada pela Unesco em virtude de suas paisagens deslumbrantes ligadas ao universo dos vinhos. Uma casa pequena, quartos aconchegantes, vistas deslumbrantes, um bom vinho de mesa e um porto estocado em grande barrica que nos fez cair de joelhos – Portugal é realmente fantástico. Um dono atencioso, hóspedes de diferentes nacionalidades reunidos em torno de uma garrafa de cristal contendo o néctar dourense para ótima conversa e uma experiência de uma noite que mereceria outras tantas. A vista do café da manhã, como mostra a foto, é a marca que merece maior registro – à época nada de jantares na casa. A região respira vinho e vale muito conhecer o que for possível. Com um destaque: as estradas são sinuosas e, por vezes, o que parece perto é muito longe. Planejar é essencial.

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Em junho de 2012 fomos à região de Champagne, e por conta da genial passagem da Volta da França estava tudo absolutamente lotado nas principais hospedarias das cidades mais turísticas. Foi quando localizamos a Champagne Gilmaire-Etienne, uma casa desses espumantes espetaculares localizada na pequenina Binson-et-Orquigny – lembremos que a França tem mais de 30 mil municípios. A dona estava começando a hospedaria, oferecia uma piscina aquecida, quartos temáticos de decoração exagerada e vendia seus vinhos na sala onde servia um bom café da manhã. A mala estava cheia e sequer tomamos seu champagne. Foi uma pena, pois perdemos a oportunidade de provar algo vindo de um micro-produtor. Paciência. Mas voltar pro barco temático da foto eu acho que não volto… Nada contra a excêntrica decoração, mas a cidade ficava longe dos principais pontos, exigindo cerca de 30 minutos de estrada.

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Em junho de 2014 foi a vez da Ca’ Brusà, que se denomina agriturismo, tendo muito mais de agricultura que de turismo. Localizada em Monforte D’Alba, norte da Itália, é de uma família simpática, que fala apenas italiano, arranha um inglês difícil e te recebe em casa. Moram ali, te dão o controle remoto do portão e a estrutura hoteleira é mínima – apesar de o quarto ser confortável. Já haviam nos avisado que o turismo no Piemonti engatinha, mas eles precisam entender que mostrar a produção é algo que encanta o turista, e ali ela não era tratada como segredo, mas nitidamente como algo comum que, aos olhos de quem se envolve todos os dias faz gerações não seria capaz de atrair alguém (como não!!!). O que salvou nosso humor foram os quatro ou cinco pedacinhos de queijos ultra especiais e “fedidos” servidos no café da manhã – a foto fala sozinha. A dona, uma senhora sorridente, trazia as iguarias e a gente se divertia. O que parecia insosso, no entanto, teve seu momento magnífico. O forte não é a cama, mas a mesa. E o jantar, um pouco caro, é um desfile quase infinito de pratos regionais extremamente bem feitos. Um absurdo o que eles arrancam de sabor de cada iguaria servida. Detalhe: o vinho é feito na casa. O chardonnay, que não costuma me agradar, é divino. E sobre os tintos nem precisamos falar: estávamos na terra do Barolo, onde reina a genial casta nebbiolo, que serve de base para bebidas mais simples que o “rei dos vinhos” e são igualmente fantásticas.

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O último destino é Carmelo, Uruguai, visitado em janeiro de 2017. Para fechar um ano intenso demais, um 2016 duro, árduo para um cientista político. A Campotinto reúne o que existe de melhor em cada uma das casas acima. O quarto é bem confortável, a casa tem apenas cinco deles. O local é de uma tranquilidade que certamente incomodará os mais ansiosos. Eles emprestam bicicletas e com elas chegamos facilmente em outras casas. Existe uma visita rápida à pequena produção de vinho, onde se destacam a atenção do enólogo Daniel e os tintos feitos à base de Tannat – a uva oficial do país. Mas o que nos demandou carinho foi um branco de viognier, produção limitadíssima, que estava bem refrescante. E o que os uruguaios chamam de meio a meio, e a casa nominou Meio & Meio – um espumante que leva 50% de vinho branco, e quando bem feito fica muito gostoso. Dizem que a bebida surgiu quando, no porto, um cidadão eternizou seu “blend” em taças misturadas intencionalmente no mercado central. Os provamos em deliciosas refeições, vindas de uma cozinha inspirada e muito bacana. A casa conseguiu unir conforto e charme no hospedar, sabor e requinte no cozinhar, espírito turístico no visitar da bodega e qualidade no vinho que serve. Genial. Que venha um 2017 repleto de boas coisas.

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Confira os links:

http://pousadafornasier.com.br/

https://www.quintasantoantonio.pt/

http://www.gilmaire-etienne.com/

http://www.cabrusa.com/

http://posadacampotinto.com/index.html