Semana passada eu escrevi sobre a visita que fizemos à Bodega Garzón, uma casa nova no mundo dos vinhos que inaugurou sede magnífica em março desse ano. Pois na terça-feira fechamos nossa breve viagem ao simpático Uruguai com passagem pela Bodega Bouza. O nome advém do apelido de seu criador. A propriedade foi comprada da família Pesquera, que desde a década de 40 fazia “vinhos finos”. Trata-se de mais uma casa que se modernizou em meio ao desafio de suavizar a “ex-dura” uva Tannat. E como a jovem Bouza é cerca de sete anos mais velha que a recém-nascida Garzón, aqui fica ainda mais nítido o potencial dos vinhos uruguaios.

Em 2014 estivemos em Montevideo e desdenhamos esse passeio. Imaginei que a Bouza fosse uma casa imensa, que realizasse um enoturismo clássico e insuportavelmente comercial. Engano dos fortes. Marcamos a visita para às 13h30. O passeio é rápido e na sua versão mais simples nada de degustação. Se o turista reservar um almoço, o tour sai como cortesia. E foi o que fizemos. Durante cerca de 45 minutos caminhamos com o simpático Pablo e uma turma de dez pessoas pela propriedade. Primeiro uma explicação sobre os vinhedos – todos próprios e divididos em três localidades distintas. Depois a sala de preparo, com três tipos de tanques – os tradicionais de madeira e de inox, e os reservatórios de concreto, que estão voltando à cena por emprestarem neutralidade aos vinhos. Trata-se de uma técnica antiga, com a qual nos deparamos a primeira vez em Navarra – numa casa que fazia um vinho bem questionável em termos de qualidade. A retomada das tradições é sempre algo instigante.

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O passeio ainda passa pela sala de barricas. A exemplo da Garzón é interessante notar como existe uma preocupação em guardar os vinhos produzidos – algo comum em qualquer casa – para ver como eles envelhecem, uma vez que a produção da Bouza é muito recente. Todos os exemplares da casa passam por madeira francesa ou americana, e infelizmente não tivemos a oportunidade de conhecer o varietal à base de nossa uva branca predileta, o Alvarinho – que nesse caso ganhou o prêmio de melhor vinho branco uruguaio de 2015 e simplesmente desapareceu das prateleiras. Por fim, ainda se visita uma coleção de veículos antigos, com destaque para Fords da década de 30 e motos da alemã BMW. Trata-se de mais um capítulo da série: vinícolas e suas excentricidades. Na Europa o mais comum são as coleções de obras de arte caríssimas, sobre as quais um dia farei alguns relatos aqui.

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Feito todo o passeio fomos ao belíssimo, elegante e aconchegante restaurante. Nada muito caro para os padrões da capital uruguaia – onde não se come bem por pouco – e uma comida divina. O queijo chamado Tetilla é a entrada perfeita. O cordeiro (foto) e a carne bovina estavam muito bons. O puré de abóbora genial (foto). Tomamos um assemblage de Tempranillo com Tannat que estava bem agradável. Junto ao Narbona Blend 001 foi o melhor vinho da viagem. Trata-se de uma linha da casa que, no restaurante, pagamos algo em torno de R$ 80 e no Brasil não costuma sair por menos de R$ 200 na importadora. Essa mesma série é encontrada no Dutyfree de lá – a bons preços – e no de cá. No caso da Bouza, o 100% Tannat e a combinação dessa tradicional uva uruguaia com a Merlot também são vinhos de excelente qualidade.

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Após pedirmos a conta nos perdemos na loja da vinícola, trazendo para São Paulo dois vinhos que certamente serão abertos no tempo certo e estarão magníficos. O “Monte Vide Eu”, feito à base de Tannat, Merlot e Tempranillo, e o Parcela Única B26, feito com Tannat. O código diz respeito às melhores parcelas do solo (numerada) e ao local. O B indica a propriedade próxima da sede principal. Se fosse A – com mostra a primeira foto – seria a própria sede, e PA remeteria à propriedade de Pão de Açúcar, cidade próxima de Punta del Este. Os preços chamam a atenção. Por lá custaram algo entre R$ 120 e R$ 150, e por aqui ultrapassam os R$ 300 com facilidade. Os uruguaios, povo simpático, receptivo e que está sentindo fortemente os efeitos de nossa crise econômica, definitivamente domaram sua principal uva e, na minha opinião, ofertam hoje os vinhos tintos de melhor qualidade no continente sob uma lógica custo x benefício. Talvez não tenham ainda a capacidade extraordinária de produção dos tops da Argentina e do Chile, mas em determinada categoria de preço são quase imbatíveis no continente, sobretudo se a bebida for comprada por lá e estiver na casa dos US$ 15 a US$ 40 dólares.

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