A resposta à pergunta acima passa por nossa vizinha Argentina. A nação é sinônimo de Malbec. A uva, no entanto, veio da França, e por mais que tenha perdido muito de sua força na terra mãe, ainda é possível beber um bom vinho dessa uva por lá. O curioso é que eles em nada lembram a doçura dos argentinos mais populares, tampouco a potência daqueles vinhos mais caros, de garrafas pesadas e muita madeira. Na França, o que conhecemos da Malbec é um vinho de corpo médio, quase tranquilo.

Nossa primeira experiência foi em 2013 na charmosíssima, romântica e enológica Saint Emilion, uma das mais incríveis cidades da região de Bordeaux. Aniversário de casamento no civil e seguimos a dica de um amigo espanhol. Fomos a um restaurante descolado, atrás de uma igreja linda. Comemos num quintal deslumbrante ao deitar do sol numa linda noite de verão. O vinho escolhido chamava-se Bombec, uma forma de dizer que o “mal” bec, que remonta a mau cheiro, era diferente ali. Advindo de uma micro sub-região local que planta bastante dessa uva, estava bem agradável e nos surpreendeu pela delicadeza, quando comparado aos argentinos.

A segunda experiência fez até parte de minhas listas semestrais de vinhos de menos de R$ 55 em novembro de 2014. Trata-se do Origal – The Original Malbec, comprado na World Wine e capaz de render boas percepções. Do mesmo produtor, um ano depois, foi a vez do Origal – Les Terrasses. Ambos morreram cedo na garrafa, mas eram decentes e capazes de mostrar novos semblantes dessa uva que encanta a milhares de brasileiros. Nesse sentido, deixo aqui um desafio: variem. Quem ama tanto a Malbec como se fosse ao Mc’Uva, experimente um francês.

Pois bem, casualmente guiando pelas excelentes e seguras rodovias da França a Ka entendeu que estava na hora de fazer aquela parada estratégica para esticarmos as pernas. A tirada era longa, cerca de 500 km entre as vibrantes Toulouse e Lyon. E para minha surpresa lá estava Cahors anunciada em placas pela estrada. A região que se orgulha de produzir em larga escala e grande variedade o Malbec francês. Isso mesmo: nossos dois Origal vieram de lá. E agora estávamos diante da cidade. Entrar ou não?

Primeiro estacionamos num posto de gasolina imenso com grande restaurante e área de lazer. Para minha surpresa, num canto da loja de conveniência existia um belo espaço destinado a explicar um pouco do Malbec de Cahors e, mais interessante: prateleiras repletas de variedade expressiva desse vinho, ou seja, uma loja de vinho no posto de gasolina! Foi de lá que por pouco mais de dez euros eu tirei o Le Petit James. Os preços variavam de cinco a trinta euros na imensa maioria dos casos, e optei por comprar algo que tivesse “um rótulo bem simpático”.

malbec 1

Durante dias o vinho ficou no porta-malas do carro. Rodou, tomou sol, quase me convenceu de que não deveria mais prestar. Mas em Chamonix, no simpático terraço de madeira de nosso aconchegante hotel, dias depois, coloquei James para respirar a temperatura externa ideal, resfriada pelo deslumbrante Mont Blanc. Pois bem: voila! Jaiminho se mostrou decente demais, honesto e correto. O que indicava ser uma diversão dotada de certa ironia se configurou num vinho agradável, seguramente o melhor Malbec que tomei dessa região no pouco que conheci de lá. A cidade findou ficando pelo caminho, mas Le Petit James será lembrado e eu insisto: prove, ouse, conheça um Malbec francês.

james