Impressionante como muitas pessoas ignoram ou menosprezam os vinhos rosés, ou rosados. Por sinal, alguns preconceituosos fazem piadas de extremo mau gosto com questões associadas a gênero e sexualidade. Quando estes sujeitos chegarem ao século XX espero que possam abrir um bom vinho, brindando o despertar de uma nova era.

No mundo dos entendedores existe debate sobre o que de fato é um vinho desse tipo. Na Larousse do Vinho, por exemplo, há uma página para os brancos e outra para os tintos. Os rosés, na publicação, são um tipo de tinto. Segundo os argumentos isso ocorre porque os vinhos rosados são feitos a partir de uvas tintas. E assim seriam uma possível classificação desse tipo de bebida. O rosé, dessa maneira, seria considerado um tinto precoce?

Para outros se trata rigorosamente de algo situado entre os brancos e os tintos, ou seja, uma bebida que possui vida própria, e cuja cor varia do levíssimo alaranjado, por vezes até um pouco pálido demais, à púrpura intensa. E nesses casos é possível dizer que a cor diz muito sobre esse tipo de vinho. Assim, se isso de fato conta, a vantagem está no fato de que costumam ser engarrafados em volumes transparentes, dando ao comprador a capacidade de perceber exatamente o que está levando. Por sinal, depois que aprendemos a gostar de vinho rosé, é também pela cor que encontramos nossos preferidos.

Voltando à Larousse, tais vinhos são classificados em dois tipos: o vivo e frutado; e o generoso e encorpado. Outra classificação comum está associada a separar o rosado entre aqueles produzidos a partir de um contato menos intenso com a pele e a semente, se comparado aos tintos; e o vinho sangrado. Nesse último caso, trata-se de uma parte do mosto separada mais cedo, o que para alguns resulta em uma bebida de qualidade inferior. Talvez seja, de certa maneira, por isso que muitos bebedores ignoram esse tipo de vinho. Mas até mesmo os sangrados são encontrados sob uma lógica de qualidade muito razoável.

Explicações apresentadas, mesmo que superficialmente e dentro de minhas questionáveis limitações, o passo final é escolher um bom rosado. A exemplo dos brancos, tintos, espumantes e fortificados, esse tipo de vinho nos permite eleger as uvas prediletas, as harmonizações ideais e as regiões de onde dificilmente tiraremos vinhos ruins.

Em relação às cepas, já tomamos rosados onde predominam, pelo menos, 14 tipos de uvas. A campeã é a Garnacha, ou Grenache. E se é assim, só se pode esperar que em termos de nacionalidade tenhamos nos concentrado na França – poderia ser na Espanha também, mas não é o caso. Junto com ela costuma-se combinar a Shiraz, a Cinsault e até mesmo a Merlot. O sul da França, mais especificamente a região do Languedoc e diversas denominações próximas produzem rosados espetaculares. Os mais claros, aqueles por vezes pálidos, são fantásticos. Em Bandol, local mais litorâneo, onde no verão sentimos o peso da maresia no ar, o Château Vannières é caro e imperdível.

Vannières

A despeito desse apego à França, localizei em nossos arquivos de provas pelo menos oito países ofertantes de vinhos desse tipo. De um total de meia centena de rosados tomados nos últimos cinco anos, os franceses respondem pela metade dos rótulos (23), seguidos por Brasil (6), Itália (5) e Espanha (4). Nessa última nação é muito comum encontrarmos vinhos de Navarra, que em muitos casos pecam pela qualidade questionável, mas na Rioja o Conde de Valdemar é muito correto. No Brasil, por mais que exista uma tendência à melhora, os vinhos desse tipo no sul nunca me encantaram, sobretudo os catarinenses. Por fim, entre os italianos, bebidas de um laranja mais intenso – com frescor e doçura acentuados – não costumam convencer. Mas me recordo de um rosé de Lázio que tomei em taça num restaurante em Roma que estava divino. Recém chegado à cidade, ainda tímido, não pedi para ver a garrafa. Paciência. Mas como surpresa, deixarei uma dica da excelente casa uruguaia Garzón. O rosé a base de Pinot Noir é muito correto.

valdemar_rosadoGarzón

 

Por fim, as harmonizações. As mais essenciais são: os frutos do mar, as saladas com bastante cor e vida, e os alimentos da dieta mediterrânea, sobretudo com pescados. Não existe probabilidade maior de sucesso do que um bom rosé francês e parte expressiva do que observo acima – lembrando que na semana passada indiquei um vinho desses por R$ 30, o La Francette.

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No mundo do Misturinhas me recordo de um Côtes du Rhône – E. Guigal com massa e frutos do mar em uma combinação que me faz salivar até hoje. Gostou? Arrisque, prove e se delicie. Mas lembre-se: vinhos rosados são servidos a temperaturas idênticas àquelas da maioria dos brancos, ou seja, de oito a dez graus. Faça o teste. Deixe-se levar, sobretudo em dias quentes. Tenho a mais absoluta certeza que escolhido o vinho certo, sem exageradas doses de açúcar e com um mínimo de empenho culinário, terás uma experiência maravilhosa. Saúde!

Guigal