Em janeiro voltei de minhas curtas férias no Uruguai e perguntei aqui se nosso vizinho do sul produz vinhos brancos maravilhosos. Num trecho inicial do texto eu indago: “mas seria heresia deixar de lado os tintos e o desafio de domar a tannat e arriscar dizer que o Uruguai faz mesmo são brancos espetacularmente agradáveis?”

Ao longo da narrativa eu dava bons exemplos para responder positivamente à minha questão. No domingo passado voltei do Uruguai ainda mais convicto do que eu perguntava. Isso porque além de repetir dois belos exemplares de minha uva branca predileta, a Alvarinho, com os conhecidos Bouza e Garzón reserva, tive três novas experiências marcantes que merecem mais do que o espaço trazido na semana passada.

O primeiro ponto de destaque está associado ao fato de que bebi três vinhos de uvas que eu dificilmente compraria com a certeza de estar levando para casa algo bom, ou que eu evito por não me cair bem. A primeira é a Torrontés. Casta de origem galega que os argentinos propagam como únicos plantadores do mundo, o que não é verdade apesar de eles dominarem a produção, sempre me desagrada seu excesso de doçura em vinhos que considero enjoativos. Aqui preciso ressalvar que nos últimos sete anos tomei vinhos relativamente baratos dessa uva: Altosur, Manos Negras, Omnium e Vallisto.

No Uruguai foi diferente. O Rio de los Pajaros Pintados da Pisano, que também não é caro, tinha potencial de nariz para me desagradar. Respirei na taça e logo olhei para o pequeno balde de inox utilizado para dispensarmos o vinho em provas. Mas na boca a experiência foi bem diferente. Muito agradável, jovem, e sem a doçura exagerada dos argentinos – tanto que tomei outro dois dias depois. Aqui só discordei do que o proprietário da vinícola disse quando afirmou ser aquele o único Torrontés produzido fora da Argentina. No Brasil eu sabia que existia algo, e hoje notei que a Don Guerino está produzindo em Alto Feliz, nas Serras Gaúchas. Não provei o resultado, mas como a cidade gaúcha fica a mais de 600 quilômetros da fronteira argentina e a Pisano a pouco mais de 200, o Brasil tem o Torrontés produzido mais longe da Argentina que existe!

Torrontés

Fonte: Las Vizcarras

Ainda sob a responsabilidade da Pisano, gostaria de destacar o Verdes Virgens, feito a base de uma Chardonnay que costuma me fazer mal, tomado em um restaurante chamado As Cuina, que homenageia Mallorca, na Espanha. O simpático local, de uma dona muito amável, fica em Punta Carretas, bairro mais sofisticado de Montevideo. Em janeiro tentei pedir o vinho no La Perdiz, ali perto, mas fui desencorajado pelo garçom. Foi bom, pois conheci o Pisano Trebbiano Toscano que tomei esse mês de novo, no mesmo restaurante. Mas voltemos ao verde, que parece tão exclusivo que sequer no site da vinícola aparece. Trata-se de um vinho jovem, rápido e extremamente refrescante, com um leve friso que não costuma me agradar, mas que surpreendeu e valeu as duas garrafas que bebemos em quatro pessoas. Estava muito bom, sobretudo quando harmonizado com um bom peixe.

Verde Virgen pisano-500x500

Fonte: Descorchados (Uruguay)

Por fim, num almoço magnífico na Bodegas Bouza, depois de abrirmos o apetite com um delicioso Alvarinho, e de duas garrafas de tinto, deixamos o Riesling para a sobremesa. E estava divino – por sinal, se não me engano existe algo entre os franceses sobre encerrar refeições com vinhos brancos. Pois bem, voltemos à uva, e aqui está outro exemplar difícil que só me agrada em vinhos mais caros – caso dos típicos alsacianos franceses Schieferkopf e Klipfel que vieram ou foram tomados por lá, ou do alemão Arndt Köbelin, que trouxe de um restaurante em Baden Baden e remetia divinamente a nozes. Destaco ainda o australiano Jaraman, de uma mineralidade fantástica. Pois o Bouza não deixou nada a dever a nenhum desses, apesar das diferenças. Feito nos vinhedos de Pan de Azúcar, próximo de Punta del Este, o resultado do vinho é muito positivo. Valeu a garrafa bebida, bem como aquela trazida na mala para uma ocasião especial e refrescante. O Uruguai, definitivamente, é terra de vinhos brancos!

riesling-2013

Fonte: Vinícola