Português é tinto. Do Douro ou do Alentejo. E destacam-se nesse seleto time, obviamente, os fortificados tradicionalmente chamados de Vinho do Porto – uma das cidades mais geniais que conheci. Pronto. Se restrinja a isso e serás feliz em Portugal. Certo?
Nada! Errado demais. Portugal respira vinho e para muito além dessas duas regiões maravilhosas e tradicionais. O Douro está ao norte de Lisboa, e o Alentejo ao leste. Num país territorialmente pequeno tudo se faz rapidamente de carro, ou um pouco mais lentamente de trem. É fácil. No Douro a cidade maior é o Porto, e no Alentejo é Évora. Mas nas pequenas localidades, nas vilas das sinuosas montanhas do Douro, ou nas saídas das rodovias expressas alentejanas descobrimos os grandes tesouros. A experiência lusitana, no entanto, deve ir muito além disso. Arriscar. Assim, vinhos do Dão como o Casa de Santar Reserva e o Duque de Viseu da Quinta dos Carvalhais são simpáticos! Na Bairrada quem reina é Luís Pato e seus vinhos a base da casta Baga, sendo o BTT impressionante. Ousando um tanto mais temos as Terras do Sado ao sul de Lisboa. Menosprezadas por alguns, o local é capaz de produzir o vinho português dos anos 2000 que mais me impressionou. Indicado por um senhor numa pequena loja próxima à Torre de Belém, falo especificamente do S de Soberanas. Um verdadeiro primor que infelizmente não se encontra facilmente sequer nas lojas especializadas locais.
Por fim, no Ribatejo também tem muita coisa interessante, pois esforços múltiplos estão tentando colocar a região no mesmo nível das mais afamadas. Um dia vou tratar aqui da visita que fiz à Quinta da Lagoalva de Cima. Foi lá que, em 2012, um dos principais enólogos da casa me recebeu gripado, e um pouco chateado com meu atraso – justificável e raro. Em meio à conversa fiz a pergunta que mudaria minha relação com um tipo específico de vinho português:
– Por que o vinho verde é tão ruim? Vou ao supermercado e são baratos, teimosamente os compro e os acho ordinários.
O olho do português se abriu de um jeito que quase lhes caíram os globos. E a resposta foi tão grosseira quanto a minha questão:
– Porque você não os sabe escolher! Não conhece o vinho e para o Brasil exportamos coisas muito simples, apesar de ser possível comprar ótimos verdes por lá.
O que poderia ser o início de um debate mais acalorado logo se atenuou quando ele resolveu me explicar, de forma muito simples, o que é um bom vinho verde. Produzido em Monção e Melgaço, ao extremo norte de Portugal, a região é separada da Espanha pelo rio Minho (Miño do lado de lá da história e Minho do lado de cá desse texto). Não a conheço e sonho com ela. Do outro lado do rio está a região das Rías Baixas, a grande produtora de vinhos brancos espanhóis da Galícia sob a orientação da uva albariño. Vinhos refrescantes, deliciosamente capazes de conversar com pescados. E o segredo está exatamente aqui, de acordo com meu instrutor português. Na uva,torque o “b” pelo “v” e “ñ” pelo “nh”, nas garrafas substituta as normalmente (mas não exclusivamente) bordalesas da Galícia pela maioria alsaciana (ou flute – aquela mais looooonga) do Minho, e procure assim vinhos verdes 100% feitos a partir da casta Alvarinho – certamente mais caros que os verdes comuns ofertados a partir de blends. No supermercado eu poderia encontrar, segundo ele, o “Deu la Deu – Alvarinho”, o que chamou de ponto de partida para descobertas geniais. E fiz exatamente isso: comprei e o tomei entre amigos em Lisboa. Sublime! A partir dali foram 10 diferentes rótulos portugueses até o fim de 2015. Destaque absoluto para o Contacto, do rei dos alvarinhos Anselmo Mendes – que contribui para o Brasil produzir bons alvarinhos – e para o Soalheiro Primeiras Vinhas. Primorosos, geniais e sempre na companhia dos amigos e dos pescados que tão bem harmonizam com essa aventura esverdeada.