Faz alguns anos o vinho uruguaio era conhecido por ser duro demais e feito predominantemente a partir da tinta tannat – que alguns bebedores odeiam, e os estudos mostram ser extremamente saudável para os fins atribuídos aos benefícios do vinho.

De um tempo para cá, algo indica que o grande esforço dos uruguaios foi domar essa uva, tornando seus vinhos mais agradáveis e bem feitos. Discursos ouvidos em vinícolas do país mostram que parcerias internacionais e uma tentativa de colher menos uvas por hectare, o que eleva a qualidade daquilo que se está produzindo, são os “segredos”. Em um resumo feito por quem mais ouve do que entende: trocou-se quantidade por qualidade. E na minha opinião deu certo.

Mas seria heresia deixar de lado os tintos e o desafio de domar a tannat e arriscar dizer que o Uruguai faz mesmo são brancos espetacularmente agradáveis? Posso ser acusado de entender pouco de vinho, e isso não seria qualquer novidade para mim. O que não quero é ofender. Mas vou repetir: o que tenho bebido de bons brancos do país me encanta. E aqui dedico um pouco de atenção para essa “descoberta”. Assim, em nosso encontro de hoje vou me dedicar a cinco brancos muito especiais. Alguns já mereceram atenção anterior aqui, mas vamos em frente.

O primeiro é o Almacen de la Capilla Chardonnay. Não se empolgue muito e tampouco saia perguntado sobre ele nas lojas brasileiras. A probabilidade de encontrar a iguaria é mínima. A vinícola Cordano é pequena e mantém aberto um armazém histórico e extremamente charmoso nos arredores da cidade de Carmelo, no Uruguai. A decoração é muito bacana e Diego, o dono, gosta de conversar e de mostrar a casa. Sua esposa, Ana Paula, é a herdeira e a enóloga responsável. Nos recebe sorrindo e logo conta que estão construindo algumas casinhas para hóspedes no meio do vinhedo. Elogiamos o chardonnay, que conhecíamos por meio de um casal de amigos, e ela sorri rapidamente. Bebemos mais uma garrafa por lá e compramos outra por menos de R$ 40. O que mais me encantou nesse vinho é que em nada lembra aqueles brancos amadeirados feitos de chardonnay, com excessivo gosto de baunilha que passa fácil por minha garganta, mas logo trava no meu fígado. Desde que passei a fugir da uva – exceção feita aos espumantes e aos bons franceses – o Cordano foi o único que agradou por sua leveza.

Almacen

Sobre o segundo falamos na semana passada: o Campotinto Viognier, resultado de uma produção pequenina que elevou o preço da iguaria, mas que faz valer o quanto se cobra. O terceiro é um vinho da mesma uva, feito pela Garzón. Em 2015 tomamos a safra 2013 e estava muito agradável. A nova loja de vinhos do aeroporto de Montevideo é muito boa e de lá trouxemos a safra 2016 – na mala veio também um pinot grigio que parece interessante.

Garzon-Viognier

O quarto é o Estival, feito com gewurstraminer e chardonnay. Vendido pelo portal da Wine, é barato – custava menos de R$ 50 – e a despeito de sua doçura se mostra um vinho refrescante, correto e digno de um bom brinde. A vinícola entrou, com um de seus brancos pouco sofisticados, em boas listas que relacionam qualidade e preço no Brasil. Sinceramente não foi algo que tenha me agradado ao extremo, mas tenho que reconhecer que aos amantes de uma bebida um pouco mais intensa no açúcar a opção é bacana.

estival

O quinto e último é o Pisano Primeira Vinha, feito com trebbiano, uma uva que conhecemos bem no norte da Itália e que nessa casa do Uruguai se deu muito bem. Bebido com peixe e ave em um excelente restaurante da capital – o La Perdiz – se mostrou refrescante e capaz de gerar belos prazeres.

Para terminarmos, note que não falei nada dos brancos uruguaios feitos a partir da uva alvarinho, minha predileta. Sobre eles eu já escrevi muito. Destaque especial para o que se produz na Garzón e na Bouza, mas existe um alvarinho um pouco mais simples na Mataojo que bebemos em Montevideo e se mostrou correto. A quarta casa a produzir vinhos a partir dessa uva no Uruguai é a Gobelet, fortemente inscrita na minha lista de curiosidades.

Gobelet

Diante de tantos exemplos: seria mesmo pecado abrir mão da tannat e dos tintos, e apostar que o ensolarado Uruguai, que tem o astro maior até mesmo em sua bandeira, não é terra de belos e refrescantes vinhos brancos?