Em maio de 2006, São Paulo parou por conta dos ataques do PCC. Tenho para mim que depois daquilo a cidade mudou fortemente seu modo de ser. Fica a impressão que as coisas passaram a acontecer mais cedo, o pulso da noite se tornou menos intenso, apesar de ainda existir. Que fique registrado que isso é apenas uma sensação, que também pode estar associada ao meu envelhecimento. Depois daquele final de semana que foi da sexta-feira dia 12 ao domingo dia 14, completei 31 anos no dia 15. A cidade ainda estava sob o medo. Foi no meu aniversário que houve um imenso toque de recolher. Como comemorar?

Foi simples. Arrumamos as coisas em casa e abrimos um bom vinho. Desliguei o noticiário e ouvimos música. Desde então sempre tomo um vinho especial no dia do meu aniversário. Em tempos mais recentes, inclusive, consigo localizar e falar sobre alguns desses rótulos. Muitos trazidos de viagens especiais.

Em 2011 a noite do dia 14 começou com dois argentinos, na presença de amigos queridos. Um deles é vinho que a moda leva embora, o Alma Negra. O trouxemos de Puerto Iguazu em aventura tratada aqui. O outro um vinho da Patagônia, que abri para me auto homenagear em razão do nome: Humberto Canale. Um gran reserva bem feito, potente. Tomaria de novo com certeza. No dia seguinte, no almoço familiar, foi a vez de um branco da Borgonha, casa bem comercial: Bouchard Père & Fils. Correto, mas sem deixar saudades.

Canale

Em 2012 um verdadeiro descontrole. Aula ao longo de todo o dia e um encontro no meio da semana entre vários amigos para uma série de vinhos. Já era tarde da noite. Os três mais interessantes eu tenho o mais absoluto respeito até hoje: um Cartuxa reserva, alentejano encorpado feito a partir de castas portuguesas. Um norte-americano potente, o Silverado, de vinícola californiana, feito a partir de Cabernet Sauvignon. E por fim um Beta Crux, argentino que assim como o Alma Negra teve seu pico de modismo, mas aqui com um toque diferente: o vinho é bem melhor e efetivamente merece bastante respeito. Os 15,5% de álcool da safra 2007 foram bem numa fria noite.

Beta Crux

Em 2013 e 2014 tive a sorte de tomar o mesmo vinho, de safras diferentes. A história do Planassos, do Priorato, eu contei aqui. Do enólogo Fredy Torres, que conhecemos nas ruas de uma pequena cidade e entrou para o nosso grupo de queridos amigos. Um baita vinho, feito a partir da simpática Carinhena. Outra história de vinhos tomados em aniversários eu contei aqui. Em 2015, nos meus 40 anos, um Ribera del Duero de extrema qualidade. Um gran reserva da Viña Pedrosa que ganhei dos proprietários em visita feita em 2009, safra 2000. Mágico!

Foto do site da Saó del Coster

A história de hoje começou à meia-noite com dupla comemoração pelos meus 41 anos. Primeiro um Cremant de Bourgogne feito por Emmanuel Dampt oferecido pelo pessoal da Vinum Est – um local novo em São Paulo, localizado em Pinheiros, que certamente entrará no roteiro das casas cuidadosas, prontas para o mundo dessa bebida especial, atenta à “cultura do vinho”, com preços corretos demais e clima descontraído, que lembra boas casas do tipo na França. O segundo um champagne, Laurent-Perrier, com amigos em casa. Já era tarde, mas a satisfação foi imensa. Que venha o restante do dia. Apesar de um pouco avesso às grandes comemorações, não faço qualquer objeção aos grandes vinhos, sobretudo em momentos especiais! Importante dizer: esse post vai ter um segundo capítulo, relatando “descontrole” que será feito mais tarde.