Dia desses estava conversando com um grande empresário do mundo dos vinhos no Brasil, fundador e dirigente de um comércio eletrônico muito respeitado do qual sou cliente. Falávamos, dentre outras coisas, em como podemos nos divertir bebendo. Com outro amigo sempre tematizamos o que chamávamos de “clássicos do mundo vinho”. O mais exótico foi um Bolívia x Peru. Se isso for comparável com o futebol, imaginamos à época um tenebroso 0x0. Dois vinhos ruins de verdade.

Saudades de voltar aos clássicos. E desse primeiro amigo recebi recentemente um presente simpático e muito generoso. Uma garrafa de Colombelle Merlot-Tannat 2018 de Gascogne que abri numa sexta-feira. A vinícola fica ao sul de Bordeaux, em Plaimont, a 100 quilômetros da região. O local é próximo de Madiran, a terra famosa dos Tannat da França. É o segundo vinho francês que tem essa uva estampada no rótulo que bebo. A sensação é muito semelhante aos Malbec de Cahors: são bem diferentes, e mais leves e equilibrados, daquilo que a Argentina faz com sua principal casta.

Em sendo assim, entendi que se bebi o Colombelle numa sexta, seria bacana beber um blend idêntico de Canelones, próxima de Montevideo, no Uruguai, no sábado seguinte. Aqui falo especificamente do Elegido 2020, da Montes Toscanini, um vinho facílimo de ser encontrado em diversas lojas e mercados de São Paulo.

Veja que divertido: mesmas castas, de países diferentes. E o que deu aqui? O preço de ambos é parecido: na Evino o francês custa R$ 60, já o uruguaio pode até ser encontrado por R$ 45 (Tappi), mas o comum é que fique na faixa dos R$ 60 (Empório Imigrantes). Assim, em termos de valor, estamos tratando de algo semelhante. Se o quesito for qualidade, fico tranquilo para dizer que ambos entregam bebidas muito simpáticas. Vinhos que combinam com queijos e embutidos, e ambos foram levados assim. O primeiro com presunto cru espanhol e queijo canastra, o segundo com um bom salame defumado mineiro e o mesmo queijo. Deu certo. Sem brigas ou aborrecimentos.

Perceba: preços equivalentes, harmonizações semelhantes e boa qualidade para essa faixa de bebidas. O francês debutou em casa, o uruguaio é velho conhecido, inclusive de minhas listas semestrais de vinhos de até R$ 55. Mas aqui vamos trazer o desempate: a questão do gosto pessoal e do sentimento.

No quesito curiosidade e percepção o francês vence. Adoro beber vinhos do velho mundo a preços acessíveis, e tenho caçado a casta Tannat em solo francês. Assim, o presente que ganhei, e isso conta muito, é algo que me causa grande contentamento. Mas sob o aspecto gosto pessoal, o uruguaio leva pequena vantagem – ou seja, empatamos de novo. Na descrição do europeu no portal da Evino existe um “quadradinho” para o item “doçura” e eu senti essa característica. Talvez se eu preenchesse a ficha teria dado dois pontos nesse quesito. E aqui estou longe de dizer que o vinho não seja bom, pelo contrário. Mas esse último quesito é gosto, e eu evito doçura. O uruguaio vai melhor porque é mais ácido, e eu adoro vinho com esse perfil. Não à toa tenho tanto interesse por bebidas de Santa Catarina e do próprio Uruguai.

Notou? A brincadeira está exatamente aqui: pro meu gosto vou de sul-americano, mas pra minha curiosidade o francês me atende bem, e vai agradar quem foge de tanta acidez. Se você sabe do que gosta e entende um pouco o que bebe, brinque com os vinhos – eles aceitam esse tipo de desafio.

colombelle elegido