Almoçar ou jantar em vinícolas nos leva a algo óbvio em matéria de vinhos: certamente beberemos algo produzido pela própria casa. A vantagem, para além de haver uma chance grande de o vinho ser bom e de podermos conhecê-lo em seu estado mais próximo da produção, sem as dificuldades impostas pelo transporte, é que restaurantes de vinícolas costumam cozinhar para o vinho. E a harmonização tem chance imensa de mostrar sua plenitude. Foi assim nos almoços das uruguaias Campotinto e Bouza, na toscana Avignonese e na piemontesa Ca’ Brusá, por exemplo.

Mas a questão central desse texto é: e quando o restaurante tem o seu próprio vinho? Não que o produza, não é disso que estou falando: mas sim quando contrata ou se emparceira com uma vinícola e oferta em sua carta um rótulo personalizado com o nome da casa!

Na Europa isso costuma ser feito de maneira menos glamorosa em restaurantes acessíveis. Pedir o vinho da casa representa receber uma jarra ou uma garrafa sem qualquer identificação. O que estamos bebendo? Só quem trabalha ali é capaz de dizer. O máximo de informação que costumamos receber é a uva ou a região de origem. Em Navarra, Espanha, mais especificamente na cidade de Olite, vimos uma vinícola vender vinhos numa espécie de bomba de combustível. O cidadão encostava com o galão e uma mangueira semelhante àquelas dos postos de gasolina enchia o vasilhame. A cobrança era feita com base no mostrador digital. Imagino que por vezes possa ser esse o modo de se vender o “vinho da casa”. Isso não representa que serão bebidas ruins, mas certamente mais baratas e simples.

No Brasil alguns restaurantes têm essa prática de colocar vinhos em jarras simples, mas em 2012 o modelo personalizado foi tema de matéria no Estadão, com destaque para algumas casas paulistanas. Em todos os casos relatados havia rotulagem própria e preços, por vezes, salgados. Aqui gostaria de falar de dois estabelecimentos que conhecemos e possuem seus próprios vinhos etiquetados. Ambas as experiências estão na Vila Madalena, em São Paulo.

O primeiro é o Pasquale, casa de 2001, que de sua belíssima adega nos trouxe em 2014 o Eccollo de Saladini Pilastri, importado pela Mistral com etiqueta personalizada. A casa do Marche – centro da Itália – produz vinhos desde o ano 1.000, e caracteriza-se por associar qualidade e preço. Feito a base de Montepulciano e Sangiovesi, provavelmente o vinho do Pasquale se aproxima muito do Rosso Piceno (vinho do catálogo oficial da vinícola) em sua composição, sendo etiquetado de forma distinta. Nesse caso, a palavra Eccolo significa “aqui está” e tendo em vista a história contada na reportagem do Estadão, atrelada à cobrança de clientes por um vinho do restaurante, o proprietário trouxe a resposta: “eccolo”!

eccolo

Fonte: Revista Em Dia (mai-2017)

O segundo local é o simpático bar de jazz Madeleine, onde assistimos recentemente à apresentação animadíssima da Jazz Band Ball. Por lá, no cardápio, um anúncio com bons descontos atrelado à venda de vinhos da correta e brasileira Pizzorno. Nessa mesma carta destaque para o Madeleine Brut, um espumante da Pizzorno feito, muito provavelmente, à base de Chardonnay pelo método tradicional descrito no contra rótulo. Um espumante bem seco, com notas agradáveis de maçã verde e capaz de nos entregar seu máximo mesmo após duas horas aberto.

jazz

Fonte: arquivo próprio

Ambas as noites foram muito agradáveis, os vinhos são escolhidos com muito cuidado por quem associa sua casa a uma bebida, e o charme para quem tem cadernos com mais de mil rótulos colados é inenarrável. Saúde!