Em 2014 fomos passar alguns dias no Uruguai para enfrentar o final do ano. Novembro a gente tenta viajar, aproveitando feriados, pra tomar fôlego e fechar o ano. O aeroporto de Montevideo tem uma loja de vinhos muito completa – El Rincon del Tannat. Ao menos tinha, antes dessa pandemia. A casa reúne boa parte das principais vinícolas do país e os preços são levemente maiores que os praticados em supermercados, com a vantagem de que você está na boca do avião.

Dentre várias garrafas, compramos um vinho da Castillo Viejo, casa localizada em Canelones, pertinho da capital. A World Wine trazia-os para o Brasil, e um blend de Tannat com Tempranillo chamado Catamayor Gran Vin nos agradava muito. Diante de uma boa oferta pelo El Preciado – gran reserva, o vinho top da casa, não tive dúvidas: trouxe.

Abrimos a garrafa em julho de 2015. A safra era 2011. Predominava a Cabernet Franc, acompanhada por Tannat, Merlot e Cabernet Sauvignon. Um corte de Bordeaux com a inclusão da uva francesa que reina no Uruguai. Quatro anos não fizeram bem ao vinho. Estava duro, verde, difícil de beber. Duas horas depois de aberto, pois nos arrastamos para consumi-lo, passou a entregar algo mais simpático, mas se foi sem deixar saudades. Frustração resume.

Em 2017 fui para um Congresso no Uruguai. Na última tarde, já cansado de ouvir e debater ciência política, eu e mais dois amigos conseguimos uma belíssima visita na Pisano – já relatei essa passagem no blog. Almoçamos nos arredores da casa e descobrimos que antes das 16h00 daria tempo de passar por mais algumas casas que o caminho mostrava. Foi assim que entramos na Pizzorno para uma boa conversa e algumas compras, e pouco tempo depois colocamos, literalmente, a cara na Castillo Viejo. A propriedade parecia meio abandonada, com um ar de desgaste, escura e com todas as portas abertas. Estacionei o carro, andamos a procura de alguém. Era julho, estava frio. Avistei uma porta onde se lia “Oficina”, e imaginei que no escritório poderia encontrar gente. Uma escada estreita e mal iluminada, uma porta no final da subida. Chegamos a titubear, mas enfrentamos. No topo uma pequena recepção apartada do espaço mais amplo por um balcão, telefones tocando, gente trabalhando. Rotina normal, e duas moças nos atenderam de forma muito simpática. Falaram dos vinhos, perguntaram se conhecíamos, e destaquei minhas compras na World Wine. Não falei do El Preciado frustrante de 2015, mas destaquei um bom Viognier e os blends de Tannat e Tempranillo.

Percebendo que ali havia alguém que conhecia seu vinho, um senhor de mais idade se aproximou e conversou um pouco conosco. Era um dos proprietários. Era mais introspectivo, mas muito tranquilo nas palavras, gentil, agradável. Falou do El Preciado com um orgulho imenso. Misturei o entusiasmo da segunda chance ao constrangimento de não atender à sugestão daquele simpático produtor. Comprei. E sábado passado o abrimos em razão da conclusão do meu pós-doutorado. Achamos simpático que fosse um vinho adquirido num evento acadêmico para marcar tal data. A safra era a mesma: 2011. E o vinho estava absolutamente exuberante. Macio, fácil, com uma capacidade de entrega muito legal. Fui ao Cellar Tracker ver o que indicavam em termos de guarda – na verdade eu sabia. Safra 2011, ideal para consumo entre 2018 e 2025. Isso! Um vinho de guarda, que permite quase 15 anos de espera entre a colheita e o consumo.

Sempre que me deparo com as informações desse portal vou pelo meio. Sete anos pra consumo entre 2018 e 2025, eu abro com 3,5 anos. Isso representava a metade de 21. E foi assim, absolutamente perfeito. Conclusão: respeite o vinho que tens para beber aquilo que o produtor queria que você sentisse na hora certa, no tempo ideal. Ou continue gastando dinheiro com vinho caro, pra dizer que conhece, sem chegar perto do que efetivamente você teria a possibilidade de beber. Mas entenda isso apenas como uma dica, afinal de contas: o dinheiro é seu e a ansiedade também.

El PreciadoFonte: Vivino.