Faz três anos que as listas de uvas mais bebidas de casa mostram: Pinot Noir e Chardonnay se alternando na liderança. A primeira é uma novidade, pois desde 2011 circularam no topo das preferências a Cabernet Sauvingon, a Tempranillo e a Garnacha (Grenache). O gosto veio se suavizando. Deslocou-se principalmente no caso dos tintos em intensidade.

A Chardonnay sempre esteve nos altos do consumo por duas razões: é parte essencial dos vinhos brancos do mundo e absolutamente presente em diversos países. Mas não é só isso: é ela quem dá as cartas de maneira emblemática nos espumantes secos brasileiros, bem como nos franceses, que bebemos – a imensa maioria deles, em nossa casa, brut ou nature. Resultado: trata-se de uma casta versátil, e olha que Chardonnay 100% em vinho branco é raro de a gente beber, pois não gosto dos exageros no uso de carvalho em locais que escapam da perfeição dos franceses mais sofisticados – que pouco bebemos nessa vida, mas conhecemos e admiramos demais nas raras oportunidades que tivemos. Exceção nacional aqui, por exemplo, seria o delicioso Legno da Pizzato, carregado na madeira, suculento, faminto e muito bom. Assim, a vantagem dessa casta poderia ser ainda maior se boa parte dos Chardonnay coubesse no bolso e entregasse frescor como o Almacen de la Capilla, de Carmelo, no Uruguai. Barato na vinícola e produzido em escala tão pequena que nem aparece por aqui – ao menos que saibamos.

Legno

A Pinot Noir é a tal “uva difícil de ser domada”, que todos que tentam e pensam que conseguem vibram. A verdade é que tem muito especialista que diz que saindo da Borgonha nada presta. Estivemos na incrível Beuane, capital do vinho borgonhês em 2012, e realmente ali e nos seus arredores tudo é absolutamente fascinante em matéria de vinho. Mas já bebi ótimos rótulos dessa casta vindos da Itália, com destaque para o La Pineta e, recentemente, comprado em bela promoção, o correto DuediPi; do Brasil, com destaque para o Almaunica reserva e aos catarinenses Villaggio Conti e Villaggio Grando; da Argentina o patagônico 006 Riverside; do Chile o que passa pelas mãos do genial Pedro Parra e; dos Estados Unidos um festival de delicadezas do Oregon e de intensidades da Califórnia, sendo o primeiro estado aquele que, diz quem entende, se aproxima mais da Borgonha e evita exageros com o uso da madeira que o francês modera muito. Aqui um destaque adicional: a Pinot, por vezes, predomina em espumantes brancos e rosês, bem como para além dos tintos é capaz de entregar rosados incríveis. Para deixar um registro aqui, alguns uruguaios como aqueles da Garzón e da Narbona.

conti PN Grando PN

Fonte: vinícolas – catarinenses, à esquerda o Conti e à direita o Grando

Mudando um pouco de assunto e olhando para versatilidade, merecem destaque final as duas únicas castas das quais já provamos vinhos dos quatro tipos que classificamos – espumante, branco, rosê e tinto. São elas: Tempranillo e Merlot. Sobre a primeira, exigentes analistas vão dizer que a tempranillo branca e a tinta são uvas diferentes. A vermelha é a queridinha da Espanha, e cultivada com outros dois nomes em regiões distintas de Portugal – Tinta Roriz (Douro) e Aragonês (Alentejo). Entre 2010 e 2016 reinou absoluta por aqui, sendo a casta mais consumida por quatro anos nesse intervalo. Na última década bebemos alguns rosados, predominantemente da Espanha, um espumante onde a Tempranillo predominava e um branco: o Edoné Gran Cuvéé rosé, bem gostoso, e o mediano Antoñita Puñuelos blanco.

edone

Já no caso da Merlot, para além de uma variedade expressiva de tintos, que por 11 dos 12 anos mais recentes a colocou entre as dez uvas mais consumidas da casa, destaque para dois espumantes rosados onde ela predominava sem qualquer sentido de raridade. Mas o Foffani foi uma surpresa branca da Itália, da região de Udine, descrito como elegante e único. O encontramos numa loja perto de casa, estava divertido e serviu para destacar o caráter incomum dessa produção. A uva é rigorosamente a tinta, mas o produtor lhe retira as cascas desde cedo e a bebida adquire características interessantes. No limite, contra uma folha de papel branca, ainda fica um rastro rosa, mas longe de se aproximar de um rosê. Veja a foto, experimente. Saúde!

Foffani